terça-feira, 21 de outubro de 2014

Motos, quedas e médicos

Gilvanicleberson Vestiu-se, pegou a moto e saiu. Falando assim, parece uma ação simples, mas eu precisaria contar os detalhes para que tal história ficasse interessante de alguma forma. Talvez o motivo seja só aumentar o tamanho do que digo. Talvez eu ache que assim fique mais bonito. Ou simplesmente porque o que eu desejo é só sua atenção como leitor. Seja como for,seja o motivo que for, vou aumentar a história porque simplesmente quero. Conforme-se com isso.

Muitos são os que odeiam quem conta o final das coisas. Pois eu contarei. Gilvanicleberson foi parar no hospital. De fato, sabendo o que acontece no fim, resta a curiosidade de saber o que houve no meio, logicamente. Está vendo como se deixa alguém curioso? É algo, de fato, fácil de fazer. Vamos à história.
José Givanicleberson de Andrade Fonseca da Silva Nascimento sempre preferiu ser chamado de Clebinho( não se sabe exatamente o porque). Ele colocou uma camiseta laranja, um tênis verde( daquele verde fluorescente que se costuma ver em abadás de carnaval), uma calça jeans azul( apertada nas pernas e com um bom pedaço de pano sobrando na virilha), Um boné branco com o bico reto amarelo e uma pequena corrente prateada. Passou o perfume e se olhou no espelho. “Você é o cara”( não que fosse realmente “o cara”, mas seu ego lhe dizia que sim)

Ao montar na moto lembrou-se da carteira. Desceu. Pegou a carteira. Subiu novamente. A moto era preta, mas seu jogo de rodas havia sido pintado (por ordem dele e conselho dos amigos) de rosa. Na lateral, em comic sans, lia-se uma frase de efeito, em branco: “Mim copiar é fácil, difícil é ser eu”. No para-lama dianteiro, um terço com a figura de Maria no centro e no farol, um adesivo com o contorno do Bobo Marley.

Foi para uma pequena festa que havia em um dos povoados próximos. Mas vamos pular da parte da ida para a parte da volta, pois essa é mais importante. Ele havia bebido o suficiente para pisar sem sentir os pés, mas julgava-se sóbrio o suficiente para voltar.

Desviando de buracos, de jegues e das cercas, conseguiu sair da estrada de chão e chegar à rodovia. Puxou o punho com força e conseguiu empinar a moto durante um período de tempo impressionante. Ao aterrissar, moveu-se um pouco para a direita e quase bateu em uma mulher que vinha no acostamento com um balde grande na cabeça e outro na mão (havia faltado água por ali ao que parece). Caiu, ralou-se e foi quicando para um pé de Jurema que havia numa das grotas na beira da pista.
Passou um tempo no chão e tentou levantar-se em seguida. Cortou a mão numa garrafa quebrada. Arranhou o rosto nos espinhos da árvore. Mosquitos picaram-lhe as partes descobertas do corpo (o que incluía a perna, já que a calça rasgara-se). Montou na moto e foi para o hospital.

...

No hospital tentou sorrir para a atendente, mas tudo o que conseguiu fazer foi mostrar o aparelho sujo se sangue. Mandaram esperar. Ao seu lado direito, estava um menino que se queimara com fogos de artifício; um homem mordido por um cachorro; uma senhora (que não parava de falar um só segundo sobre a filha da vizinha, com doze anos, que engravidara de um rapaz de quatorze recentemente) e uma mulher com um pano no olho. À sua esquerda, um menino jogando no celular; alguém difícil de identificar como homem ou mulher, com uma coisa esquisita pendurada no braço; e uma garota jovem com uma criança nos braços.
Gritos vinham de lá de dentro. Buzinas e sirenes vinham de lá de fora. E um carro anunciando um “nota de falecimento, convite...”, passava na rua de trás. Após certo tempo esperando, tentou falar novamente com a atendente:

-Oi! Alguma notícia do médico?

-Não senhor, terá de aguardar que ele chegue. Estamos esperando desde as oito da manhã.

-Vocês podem ao menos dar um atestado para eu apresentar no trabalho amanhã?-perguntou num tom enrolado.

-Infelizmente não -disse com um aceno de cabeça – o único que pode fazer isso é o médico ou a assistente social, mas nenhum deles está.

-Ahh... Brigado.

Saiu meio sem jeito da portaria, montou na moto novamente e tentou ligá-la. Ia para casa, não sem antes comentar para si mesmo:

- Nem quere vim trabalhar esses médico- deu um suspiro e sentiu algo doer por dentro- povo véio sem responsabilidade.

E foi embora. 

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